Quem nunca ouviu falar que mãe tem sexto sentido, que prevê as coisas, que sabe de tudo?
Existem várias maneiras de pensarmos essa questão, mas a que me parece mais plausível, pelo que conheço e estudo a respeito das mães e seus bebês, desde a gestação, é de acordo com a teoria do pediatra e psicanalista D. W. Winnicott, que utilizo como referência para embasar meu trabalho.
A mãe devotada, que está envolvida nos cuidados com o seu bebê e consegue estar integrada com seu filhinho é capaz de entender quase que magicamente o que ele necessita, justamente por viver uma relação que no início é como se fossem dois em um – é claro que preciso frisar que estamos falando dos casos em que essa relação se dá de forma saudável, sem me referir aos que necessitam de ajuda e orientação .
O bebê, no início de sua vida, necessita de outro ser para sobreviver e o padrão dos bons cuidados que ele receberá – e esperamos que quem o faça seja sua própria mãe, pois ao que tudo indica é a pessoa mais preparada para isso – certamente contribuirá para que ele se desenvolva bem e psiquicamente saudável.
Quando falamos em intuição materna, parece que estamos nos referindo a algo etéreo, mágico, que transcende o que se vive no cotidiano. Entretanto, o que tenho a dizer a respeito disso é que se trata de algo muito mais simples de entender do que imaginamos, simplesmente porque parte da relação da mãe com o bebê. A mãe conhece o seu filho pela convivência e integração com ele – e não é possível conhecer um bebê sem se relacionar com ele. Mas essa relação, por ser muito intensa, passa a ser até mesmo visceral, e é por isso que a mãe é capaz de diferenciar os diversos choros e balbucios e saber do que o bebê necessita de uma maneira que somente ela sabe, e aos olhos de quem está de fora, parece até mesmo algo muito estranho. Pode ser que isso seja nomeado de intuição, e trocando em miúdos, nada mais é do que algo que brotou de uma relação de intenso convívio, em que no início, mãe e bebê se fundiram em uma só unidade, onde o bebê viveu a ilusão de que o mundo fora criado por ele.
Essa relação se torna a base da saúde emocional de um adulto, que só pode chegar a isso porque, quando bebê, teve a sorte de ter uma mãe – ou alguém que a substituísse –, que atendeu às suas necessidades de forma suficiente, e que na medida em que ele foi crescendo, foi se transformando e se adaptando às novas fases e outras necessidades.
O amor materno, expressado nos cuidados com o filho, embora este não conheça tal significado, serve como base para a sua saúde psíquica. Quando for adulto, ele certamente perceberá que foi alimentado por isso, pois será emocionalmente saudável.
Sendo assim, o que o senso comum chama de intuição materna nada mais é do que o fruto de uma relação integrada, que só pode acontecer porque mãe e bebê viveram juntos uma relação intensa e saudável.
Cynthia Boscovich
Psicóloga clínica e psicanalista. Membro regular da Sociedade Brasileira de Psicanálise Winnicottiana. Atende adolescentes e adultos em seu consultório. Desenvolve também um trabalho específico com gestantes, mães e bebês na área de prevenção e tratamento.